Tuesday, June 30, 2009

Bloco revisto e explicado (Jornal Registo - 29/06/2009)

O grande fenómeno da política portuguesa dos últimos 10 anos é, sem dúvida, o Bloco de Esquerda. De um movimento residual, que foi essencialmente, um restyling do velho PSR, transformou-se num partido do “patamar 10%”, com uma forte implantação no eleitorado jovem e urbano.
Compreendo facilmente porquê e até apresento a seguinte confissão: até simpatizo com o Bloco. É verdade! Simpatizo com a sua irreverência e criatividade, com o facto de se apresentarem com ideias frescas que contrastam com algum “cinzentismo” da classe política portuguesa, com o seu profissionalismo e capacidade de trabalho (ver o trabalho efectuado no Parlamento), com a capacidade de comunicação (e alguma sedução!) de figuras como Ana Drago ou a agora esquecida Joana Amaral Dias.
Em síntese, simpatizo com quase tudo o que é acessório (a forma) para, paradoxalmente, me opor a tudo o que é fundamental (o conteúdo)! Efectivamente, um modelo de país ou sociedade, construído à base das ideias e projectos do Bloco equivale a um filme do género “dramático”, que poderia bem acabar em “terror”.
Primeiro a ideologia. A cartilha, para os mais esquecidos, continua a ser a marxista, entrelaçada nas correntes estalinistas e trotskistas. Como tal, a visão totalitária de sociedade (modelo único), está sempre presente. Depois, os casos concretos. A crise internacional actual (que não tem a ver com excesso de liberalismo ou mercado, mas sim falta de ética e regulação) deu coragem aos senhores do Bloco para, nos seus outdoors, mostrarem a ponta do iceberg. Desde já, sabemos que passaríamos a ter uma economia nacionalizada, centralizada no sector empresarial do Estado (EDP e GALP seriam já as primeiras vítimas). Para quem não se lembra no que isto resultou em 1975, é favor questionar a sabedoria dos mais velhos. Depois (também através de outdoors) ficámos a saber que “quem tem lucro não poderia despedir”. Gesto humano e solidário à primeira vista, desastroso num olhar mais apurado. Efectivamente, poderíamos, no limite, ter um conjunto de empresas, estruturas gigantescas, ineficazes e pouco competitivas, que desde que dessem 1 euro de lucro no final de cada ano, seriam intocáveis. Aqui não haveria possibilidade de criar, de inovar, de reestruturar, de premiar o mérito, de facilitar a empregabilidade dos mais jovens.
Por último (a cereja em cima do bolo), a política externa. Não se limitando a contestar a globalização (demagogia que já seria suficiente, tendo em conta que é consensual que a globalização tirou da pobreza extrema centenas de milhões de pessoas nos últimos 20 anos), o Dr. Louçã assumiu recentemente que também queria Portugal fora da NATO. Como tal, num cenário de incertezas e ameaças globais, teríamos um País fora da sua rede natural de alianças, algo que obrigaria (como faz a Suécia ou a Suiça) a fortes investimentos nas forças armadas – isto se a independência e segurança de Portugal estivesse nas 10 primeiras preocupações do Bloco, coisa que duvido.
Portanto, caro(a) eleitor(a), da próxima vez que a simpatia que tem pelo Bloco o levar a equacionar uma cruz no quadrado respectivo, lembre-se, por favor, da sociedade “forçadamente equalitária”, estagnada e acrítica que teríamos se estes simpáticos senhores e senhoras tivessem real poder de decisão. Fica o desafio à reflexão…

Thursday, June 18, 2009

Capital Humano: que aprendizagens, que competências queremos? (Jornal Registo 15/06/2009)

Tem sido dito e repetido (e bem!) que Portugal deve apostar no desenvolvimento dos seus recursos humanos. Estaremos todos de acordo. Nos tempos que correm, mais do que nunca, serão as pessoas e o seu capital de conhecimentos e competências a marcar a diferença neste mundo globalizado. A questão será por onde começar e o que fazer em concreto.
O actual governo apontou um caminho: o reconhecimento e certificação de competências, base do mediático e emblemático programa “Novas oportunidades”. Nada tenho a opor à bondade das intenções. E reconheço que, para algumas pessoas, destinatárias do programa, seja uma marca de integração e progressão e tenha um carácter simbólico forte. Assim como reconheço o risco da imagem de facilitismo que pode transmitir para o exterior e a fama (seja ela justa ou injusta) de que se está a trabalhar apenas para as estatísticas.
Mas, sinceramente, parece-me pouco e que não será esta a questão essencial e estruturante. As grandes questões serão o nosso modelo de aprendizagem, o que queremos fazer dele e o papel das instituições que o sustentam.
Nas últimas semanas, duas entrevistas que tive a oportunidade de ler reforçaram a as minhas convicções sobre esta matéria. O filósofo e sociólogo francês Edgar Morin, que esteve m Portugal em meados de Maio, veio defender uma reforma bastante radical do modelo de ensino das escolas e das universidades, enfatizando a necessidade de passarmos da actual 'hiperespecialização' para uma aprendizagem mais ampla e generalista, que integre as várias áreas do conhecimento e da cultura, que prepare os jovens lidar com o imprevisto e a mudança, para desenvolver as competências para atacar os problemas gerais e daí partir então para problemas específicos.
Tive também a oportunidade de ler declarações de António Câmara, presidente da YDreams, empresa portuguesa pioneira mundial em soluções tecnológicas de interactividade e realidade virtual. A sua tese é simples e directa: a aprendizagem e inovação na Europa (e em Portugal) têm um modelo arcaico e ineficiente, pouco viradas para o empreendedorismo e para o impacto no tecido empresarial – tudo “embrulhado” em muita burocracia e poucos resultados.
Daqui, atrevo-me a deduzir dois corolários: 1) não estamos a preparar as novas gerações com os conteúdos e conhecimentos essenciais à sua cidadania e à sua empregabilidade neste século XXI; e 2) não estamos a criar oportunidades para uma aprendizagem mais experimental, “vivencial”, que permita partir rapidamente do conhecimento para a aplicabilidade – e, nas áreas empresariais e tecnológicas, tal será essencial.
Perguntas: será que a energia e recursos aplicados noutras prioridades não poderiam, com maior retorno, ser aplicados na criação de modelos ou projectos-piloto (ex. uma nova universidade de excelência) que tornassem Portugal um case-study mundial e um dos lugar mais atractivos e vibrantes para estudar, investigar e começar uma vida profissional? Em que, efectivamente, se investisse na formação e desenvolvimento de competências pertinentes para cada jovem poder enfrentar os desafios destes novos tempos? Requisito essencial: vontade política!

Carlos Sezões

Sunday, June 14, 2009

A dívida que fica...



A imagem da capa da última edição da The Economist, vale mais que mil palavras. O massivo investimento público que a corrente crise originou deixará um lastro de dívida pública que poderá ser insustentável para as próximas gerações. Em Portugal, caso paradigmático, que discute agora a pertinência (e mais valias) de grande investimentos em infra-estruturas, deverá pensar e repensar esta matéria...antes que seja tarde demais!

Monday, June 08, 2009

Estado de Direito ou República das Bananas?

Cena inédita e (quase) surreal: centenas de polícias em plena manifestação junto à residência do primeiro-ministro, arremessavam os seus bonés para a rua, onde até, por acaso, iam passando alguns carros que se tornaram alvos involuntários. Os cântigos destes "agentes da autoridade" mimavam o PM como "mentiroso". Se existem imagens representativas e sintomáticas do estado a que chegou o Estado, esta é uma das mais marcantes. Para qualquer cidadão é óbvio que este Estado perdeu o respeito e não se dá ao respeito e que, aparentemente, nem consegue garantir o bom desempenho das mais básicas funções de soberania e segurança. Não se admirem com o aumento das abstenções e dos votos extremistas...

Wednesday, June 03, 2009

Fantasmos do passado...

Antigos dirigentes socialistas e social-democratas de países europeus, incluindo Mário Soares, divulgaram hoje uma declaração defendendo uma nova maioria no Parlamento Europeu que permita a apresentação de um candidato socialista à presidência da Comissão Europeia.
"O Partido Popular Europeu (PPE) já apoiou o seu candidato oficial à presidência da Comissão Europeia. É com expectativa que os socialistas e social-democratas e outros progressistas esperam um candidato oriundo do Partido Socialista Europeu, único partido europeu que pode apresentar uma alternativa à direcção europeia do PPE", refere a declaração assinada por oito antigos dirigentes.
Felipe Gonzalez (Espanha), Lionel Jospin (França), Gerard Schroeder (Alemanha), Paavo Lipponen (Finlândia), Constantino Simitis, (Grécia) e Franz Vranitzky (Áustria) são os antigos primeiros-ministros que assinam a declaração, subscrita ainda por Aleksander Kwasnieski, antigo presidente da Polónia.

In DN

É paradoxal (ou talvez não) esta coligação de figuras do passado que, sem qualquer projecto alternativo, apregoam o seu preconceito ideológico-obsessivo com a Comissão Barroso. Bem dizia Tony Blair: mais do que esquerda ou direita, o combate ideológico faz-se hoje entre a abertura e as possibilidades entusiasmantes da globalização e as mentes fechadas, saudosas dos proteccionismos do passado.

Monday, June 01, 2009

Liderança e Mudança na agenda de Portugal (Jornal Registo - 01/06/2009)

Muitos e diversos diagnósticos circulam, desde há muito, pela sociedade portuguesa sobre a essência (e em muitos casos o fatalismo) de “ser Português”. De facto, é consensual que as dimensões culturais são importantíssimas para compreender as atitudes e comportamentos dos Povos perante os desafios que se lhes colocam. A nossa “latinidade” explica muitas coisas: a rejeição da incerteza e do risco, a enorme preocupação com a segurança, a ansiedade e a pouca auto-confiança, o culto da hierarquia, a pouca orientação para o desempenho, os resultados e o mérito. Tudo isto ajuda a explicar a necessidade que temos, periodicamente, de “homens providenciais”. Depois, a nossa história muito própria traz mais condimentos. O sebastianismo, a acomodação ao Estado, o fado e a saudade, a esperança que venha de fora (as colónias primeiro, a Europa depois) a solução para restaurar a nossa grandeza, a nossa riqueza ou, apenas, alguma qualidade de vida (fraca ambição que restou das muitas ambições de séculos).
Contudo, penso (desde já, confesso, com optimismo) que nada disto é inevitável e imutável. Para além das nossas muitas qualidades (sim, também as temos!), nas dimensões da nossa vida – a nível social, económico, político e outras - necessitamos de algo que nos faz bastante falta, como compensação para as questões que atrás mencionei: Liderança. Liderança nas empresas, liderança no Estado central, liderança nas autarquias, nas Universidades e noutras organizações e sistemas sociais. Liderar significa não estar apenas a gerir o dia-a-dia, a assegurar os processos correntes, de olhar constantemente para o lado e para trás e ver se todos concordam connosco. Liderar significa olhar em frente, ter uma visão estratégica, de longo prazo, e mobilizar vontades para a atingir. Significa compromisso emocional e participação. Significa encarar e ponderar os riscos e tomar decisões com firmeza e sentido definido.
Olhemos para o mundo empresarial. As empresas bem sucedidas (conheço várias, na minha actividade profissional), com níveis de rentabilidade e de sustentabilidade ao longo do tempo não são fruto do acaso. São consequência da sua história, da forma como Líderes conseguiram promover os seus valores e as suas estratégias e de como conjuntos de pessoas (por vezes, gerações de pessoas), comprometidas com a missão da Organização, conseguiram manter elevados níveis de motivação, trabalho e resultados. Talvez precisemos destes exemplos na sociedade portuguesa, de uma forma mais transversal.
Mas, neste contexto, olhando para a nossa conjuntura política actual, não resisto a perguntar: necessitamos de um governo omnipresente, tentacular na sua influência, receoso da crítica e do “activismo” da sociedade civil e com um discurso paternalista do tipo “não se preocupem, nós tratamos de tudo”? Será um bom exemplo? Sinceramente, penso que não. Necessitamos antes de governos responsáveis, mas desafiantes, que assumam os riscos e sejam reformistas na substância e não apenas no papel. Que sejam Líderes…e não apenas gestores do pouco que ainda há para gerir.

Carlos Sezões