Monday, December 21, 2009

À espera de 2010…


Alan Kay, um reputado cientista norte-americano, dizia, com razão, que a melhor forma de prever o futuro é inventá-lo. Faz sentido! Mas, neste mundo de críticos, comentadores e adivinhos, muitos não compreendem que boa parte das respostas estão sempre na nossa mão e que não somos (ou não devemos ser) meros espectadores passivos do que o acaso ou os outros fazem acontecer.
Na psicologia existe, como muitos saberão, o conceito de locus de controlo. Tal é uma característica de personalidade definida como a convicção de que as nossas atitudes, decisões e acções influenciam os resultados que vamos obtendo no dia-a-dia, numa evidente relação causa-efeito. Os indivíduos com um locus interno acreditam que controlam as suas próprias vidas enquanto as que têm um locus externo acreditam que o acaso, o destino, a falta de sorte ou qualquer conspiração obscura está por detrás do que de mal vai acontecendo. Escusado será dizer que em Portugal, existe frequentemente uma predisposição para o segundo caso.
Tudo isto a propósito das inevitáveis procissões de previsões e desejos para o próximo ano de 2010 a que vamos agora assistir. Não quero contribuir para esse peditório. Como tal, deixo apenas algumas ideias soltas sobre como cada um poderá contribuir para um novo ano relativamente positivo, fazendo algo que, efectivamente, dependa essencialmente da sua vontade e decisão:
 Concretizar um novo projecto ou inovação profissional:
A nossa realização, pessoal e colectiva, depende em larga medida da nossa esfera profissional. Como tal, numa perspectiva de lançamento de um novo negócio (empreendedorismo, assumir-se por conta própria) ou inovando no seio de uma organização (por conta de outrem) muitas são as possibilidades de marcarmos a diferença e de não sermos apenas mais um número. O efeito de criação de riqueza e de novos empregos pode muitas vezes ser despoletado por este passo inicial.
 Dar atenção à Comunidade em que se está envolvido:
De forma simples, assumir um mínimo de participação voluntária na comunidade (região, cidade, bairro) em que estamos inseridos. Pode ir desde o simples acto de votar em eleições, acompanhar de forma próxima as intervenções das autarquias, participar em associações e em actividades de melhoria da qualidade de vida, culturais, assistenciais, numa óptica de voluntariado.
 Exigir qualidade dos serviços públicos que temos
Muito mudará quando a esmagadora maioria dos portugueses assumir uma atitude crítica e mais escrutinadora sobre os muitos serviços públicos que este Estado coloca à nossa disposição (educação, saúde, segurança, assistência social, entre outros); e será esta atenção cada vez mais esclarecida e exigente que irá obrigar às necessárias reformas (umas adiadas, outras concretizadas a passo de caracol).
 Investir na educação, na formação e no conhecimento
Numa óptica mais formal (cursos, certificações) ou informal (auto-aprendizagem, por exemplo, através da Internet), é fundamental o desenvolvimento constante das nossas competências (cognitivas, técnicas, comportamentais). Este investimento é cada vez mais o factor decisivo para a nossa produtividade/ competitividade e para um sucesso pessoal e profissional.
 Promover uma boa gestão pessoal/ familiar dos recursos.
A nível dos consumos (óptica financeira) e dos recursos (na água, na eficiência energética inerente a electricidade e combustíveis), seria útil começarmos a pensar numa gestão mais racional. Efectivamente, enfrentar os desafios da escassez de recursos e da sustentabilidade ambiental exigirá cada vez mais de nós nestas áreas, num futuro muito próximo.
Conforme a nossa escala de recursos (dinheiro, tempo…), o nosso poder, influência ou nível de responsabilidade, algumas destas realizações poderão marcar a diferença entre um ano mau ou razoável e um ano bom. Porque, no final do ano, as estatísticas do PIB, défice, taxa de inflação ou desemprego representarão, em boa parte, o somatório de milhões de decisões destas.

Carlos Sezões

Wednesday, December 09, 2009

Europa: que projecto, que protagonistas, que ambição?


Confesso que sempre fui um entusiasta do chamado “ideal europeu”. Clarificando o conceito, ter na Europa um espaço e um projecto comum, abraçado por cerca de 500 milhões de pessoas, fundados nos princípios (hoje mais universais) da liberdade, democracia, tolerância, estabilidade social e sustentabilidade ambiental, que daqui se espalharam pelo mundo. Agora, para se construir algo é necessário vontade, capacidade de liderança e instituições que funcionem.
Por tudo isso, sempre vi com bons olhos o Tratado de Lisboa. Parafraseando a velha expressão de Churchill, este tratado será a pior opção do mundo com excepção de todas as restantes que poderiam ser tentadas. Por muitos defeitos que tenha, teoricamente, confere à Europa melhores mecanismos de tomada de decisão, reforça a democracia interna com a atribuição responsabilidades mais importantes ao Parlamento Europeu, incrementa a coerência da sua política externa e facilita, assim, a sua projecção no mundo. Áreas como o combate ao terrorismo ou a segurança energética deverão ser, com o novo tratado, mais bem geridas e coordenadas.
Mas, como sempre as políticas precisam de protagonistas. E aqui, a expectativa era grande, até como contraponto ao que tem sido a imagem de marca da União Europeia: a burocracia instalada de Bruxelas, frequentemente “invisível” aos olhos da opinião pública e dificilmente escrutinada e avaliada. A burocracia que nos brinda com todo o tipo de regulamentos, desde o formato da fruta à restrição do uso de palavras como “Senhor” ou “Senhora” para combater o chamado “sexismo”(!).
De facto, sempre que a Europa avançou foi graças a líderes como Monnet, Schuman ou Delors. É por isso que me pareceu absurda a recusa de alguns países em ter Tony Blair como novo Presidente da União Europeia. Com todo o respeito e benefício da dúvida para Van Rompuy (o excolhido Presidente da União) e Catherine Ashton (responsável pela política externa), parece que, para muitos dirigentes europeus, a opção foi ter protagonistas apagados, pouco relevantes e carismáticos, um mínimo denominador comum com vista a manter os líderes (e interesses) nacionais de cada um acima dos interesses europeus.
Mau sinal, nestes primeiros dias de vigência do tratado. E isto quando os maiores desafios estão aí perante a passividade da Europa. Em primeiro lugar, na política externa, onde a influência da Europa no mundo não cessa de diminuir. Mesmo aqui ao lado, no nosso “quintal”, não conseguimos ser relevantes na resolução dos problemas do Médio-Oriente ou nos enormes desafios colocados ao desenvolvimento de África (comparar, por exemplo, com a influência da China). Depois, em termos de política de defesa e segurança, continua a completa apatia. Apesar de compreender quão impopular será este discurso, os políticos europeus verdadeiramente responsáveis não podem continuar a assobiar para o lado sem falar verdade às suas opiniões públicas e eleitorados: é necessário investir na defesa e participar activamente nas intervenções que, por esse mundo fora, vão sendo feitas, em nome do combate ao terrorismo (ex. Afeganistão) ou da manutenção de paz e estabilidade em várias regiões do globo. A situação de conforto dos últimos 50 anos, de aconchego no abraço protector dos EUA, já não é sustentável neste mundo multipolar. Quem quer ter voz activa e ser respeitado no xadrez das relações internacionais, tem de mostrar vontade e investir. Sim, investir será “pagar” parte das soluções, algumas necessariamente militares.
Por último, talvez o maior desafio, a reforma progressiva do modelo social europeu. Aqui, há que definir e conjugar de forma hábil as políticas relativas à demografia, imigração, segurança social e competitividade das economia, sob pena de a próxima geração de europeus se defrontar com cenários (ainda) mais negros.
Por tudo isto, os europeus devem responder a estas importantes questões: que projecto, que protagonistas, que ambição ainda temos para este velho continente?

Carlos Sezões