Thursday, November 18, 2010

NATO em Portugal…é mesmo importante?


Portugal acolherá nos próximos dias a cimeira da NATO. Bem sei que no actual cenário de crise económica e social, as questões de defesa e segurança internacional estão nos últimos lugares da lista de prioridades dos portugueses. Para muitos, parecerá um dispêndio de energia e dinheiro qualquer preocupação com estas questões por parte dos nossos políticos.
Mas…acreditem que a importância desta cimeira é maior do que aparenta! Neste mundo cada vez mais globalizado e interdependente mas, simultaneamente, mais incerto e inseguro, a existência de uma organização de defesa internacional, com capacidade militar comprovada, que agrupa a grande maioria das democracias do hemisfério norte, é uma das poucas coisas que podemos considerar certas e seguras. O novo conceito estratégico, a ser aprovado e assinado nesta reunião, vai ser importante para a Europa e os EUA decidirem o seu papel no mundo.
Em primeiro lugar, o contexto que temos. O mundo pós-guerra fria de 1989-2001, com a supremacia ocidental assente na liderança dos EUA e o período de indefinição e transição 2001-2008, marcado pela ameaça terrorista e pelo desencadear dos conflitos do Iraque e do Afeganistão, são etapas passadas. Está a emergir um mundo multipolar, balizado por grandes potências (EUA e China) e médios poderes (Brasil, Índia, Rússia, Japão, Turquia entre outros), cada qual com a sua agenda própria. A União Europeia, que exclui propositadamente da frase anterior, ainda não escolheu bem o que quer ser – e tenho dúvidas que o faça em breve por falta de liderança interna. De facto, as crises que assolam com particular gravidade as economias ocidentais assentes no modelo de estado-social, deixam poucos recursos e pouca vontade de investimento em matéria de segurança. O que é deveras preocupante. Qualquer observador atento à geoestratégia, antevê facilmente imensos focos de conflito para os próximos 25 anos. Seja por recursos (luta por matérias-primas, água ou fontes de energia), seja por razões económicas e monetárias (a liberdade do comércio mundial e conflitos em matéria cambial), por razões demográficas (migrações) ou religiosas (fundamentalismo islâmico), não esperemos um mundo muito racional, sensato e pacífico para as próximas décadas. Por uma questão de capacidade de antevisão e compromisso com as gerações futuras, não podemos simplesmente ignorar este contexto de (in)segurança apenas por que é mais confortável (e mais barato).
Na nova estratégia a sair da cimeira de Lisboa, deverá estar bem vincada a missão, o âmbito de actuação e a capacidade de resposta que deverá estar preparada para fazer face às ameaças. Em síntese, qual a deverá ser a projecção da NATO – a nível mundial, considerando que a defesa dos seus membros começa muitas vezes do outro lado do mundo a milhares de quilómetros das suas fronteiras? Qual o papel do polémico escudo anti-míssil, um instrumento-chave para a defesa da Europa e dos EUA? Avançará com ou sem a parceria com a Rússia? Qual a forma mais eficaz de abordar e responder à ameaça do terrorismo islâmico? A missão da NATO (ISAF) no Afeganistão é para manter até à pacificação total e democratização do país? Haverá compromisso e recursos para tal?
Aqui se vai evidenciar a capacidade dos actuais líderes políticos olharem para além dos seus calendários eleitorais e da pressão mais imediata das suas opiniões públicas. Como não há “omoletes sem ovos”, os países da NATO deverão começar a cumprir a obrigação de investimento de 2% do seu PIB nos orçamentos de defesa (algo cumprido apenas por cinco países). E não esperar que, sempre que há problemas, sejam os EUA a pagar a factura em dinheiro e vidas humanas…

Carlos Sezões

Friday, November 05, 2010

Cidades sustentáveis: apostar na qualidade de vida


Opinião muito pessoal: boa parte dos nossos problemas, enquanto membros desta grande comunidade chamada Portugal, reside na nossa incapacidade para uma auto-responsabilização e consequente boa gestão dos nossos espaços: conforme a escala considerada, falo das nossas cidades, vilas, aldeias, freguesias ou bairros. Tudo esperamos ser resolvido pelo sempre omnipresente (e quase sempre ineficaz) Estado central. O poder autárquico democraticamente eleito já tem cerca de 35 anos mas, não obstante as suas muitas conquistas, não conseguiu ainda garantir níveis aceitáveis de sustentabilidade, qualidade de vida, conforto e boa gestão do espaço público. Falarei em particular das cidades, como pólos de atracção de pessoas e como focos de inovação cultural, tecnológica e económica. De facto, em sociedades pós-industriais e de forte cariz urbano, novas problemáticas colocam-se a todos os seus cidadãos e políticos-decisores: da desagradação/ desertificação dos centros, à obsolescência das antigas zonas industriais, da mobilidade à eficiência energética, da inevitável multiculturalidade aos fenómenos de pobreza, exclusão e criminalidade, do (des)ordenamento urbanístico à competitividade económico-empresarial, muitos são os desafios que encontramos.
Primeiro, penso ser importante reflectir sobre a questão da sustentabilidade, numa perspectiva integrada. Será que as nossas cidades são realmente sustentáveis nas suas vertentes económica (atracção de investimento e criação de riqueza e empregos), social (inclusão e vida harmoniosa das comunidades) ou ambiental (ordenamento, ocupação do espaço, energia, gestão de resíduos e poluição)? Será que os nossos investimentos em soluções de mobilidade são os adequados? Será viável que a logística de abastecimento alimentar aos centros urbanos continue assente numa rigorosa separação cidade-campo (ainda me recordo das estratégias de agricultura urbana defendidas pelo arquitecto Gonçalo Ribeiro Teles)?
Depois, pensemos a estrutura das cidades, das suas edificações. Uma questão premente é o desenvolvimento de estratégias de recuperação rápida dos centros históricos, que estão no estado que todos conhecemos. Há que fazê-lo com medidas integradas, que promovam a atracção de indivíduos e famílias, nomeadamente nos segmentos etários mais jovens. Aqui, olhando para a realidade portuguesa, não podemos ignorar a necessidade de um novo regime do arrendamento urbano, uma vez que o de 2006 pouco ou nada tem resolvido. A existência de cerca de 400.000 fogos arrendados com contratos celebrados antes de 1990, muitos dos quais com rendas inferiores a 50 euros, é problema que exige medidas efectivas e rápidas (de preferência, que produzam efeitos antes que os edifícios em causa comecem a ruir). Há que criar condições de flexibilidade para a convergência gradual com os preços de mercado e dinamizar a inserção de imóveis devolutos no mercado imobiliário. Como é sabido, somos um país que tem mais de 500.00 imóveis abandonados com consequências inerentes em termos de estética, degradação urbana e insalubridade.
Ainda refiro a necessidade, no âmbito sócio-cultural, de estratégias de “urbanismo de proximidade”. A “cultura de praça” ou “do bairro”, com as suas especificidades, deve ser motivadora para o empenhamento dos seus cidadãos. Promover a cidadania, dignificar o espaço de convívio público, dinamizar a oferta cultural e recreativa, apostar em parcerias e partilha de tarefas com instituições de solidariedade social será fundamental, até para garantir as questões de inclusão antes mencionadas. De facto, os paradigmas do “bairro social” e do “condomínio privado” (ambos exemplos extremos, promotores da exclusão), tão ao gosto português, devem, definitivamente, dar origem a uma cultura de cidade competitiva, atractiva e…sustentável.

Carlos Sezões