Thursday, March 17, 2011

Educação: sabemos para onde vamos?


Se queremos agir sobre uma realidade, devemos começar por compreender essa mesma realidade, sem preconceitos ou mistificações. O mundo mudou bastante nos últimos 20 – 30 anos para que tenhamos, em determinadas matérias, uma visão fundamentalista e avessa a qualquer mudança. A Educação é uma dessas áreas.
Não é frase feita, é mesmo a minha convicção: a Educação é a base de qualquer sociedade. Em Portugal, foi objecto de um enorme esforço de investimento e desenvolvimento nos últimos 35 anos, tendo em conta o desafio quantitativo de massificar e democratizar o acesso à escolaridade. Olhando para a oferta educacional e para as taxas de cobertura dos vários graus de ensino, esse desafio foi razoavelmente enfrentado e vencido.
Neste momento, na era da globalização e do conhecimento, o desafio é outro, de natureza qualitativa: dotar crianças e jovens de capacidades (pessoais e sociais) que lhe permitam uma saudável inserção na sociedade e aprendizagens e competências para enfrentarem os desafios da empregabilidade deste século XXI.
Como tal, parece-me essencial equacionarmos ou repensarmos algumas questões críticas para os resultados que desejamos: os modelos de ensino/ aprendizagem, os conteúdos e as metodologias pedagógicas, os modelos de gestão escolar, a responsabilidade da família e da comunidade envolvente.
Infelizmente, como cidadão relativamente atento a este tema, vejo que em Portugal se gosta mais de discutir o acessório e se perde a noção do que é essencial. O debate político amplificado pela comunicação social foca-se em temas como as carreiras, as remunerações e as avaliações de professores ou no encerramento da escola A ou da escola B; ora se aborda o (complicadíssimo) sistema de colocação de professores ou o aparente facilitismo dos exames que nos leva a questionar se não estaremos a trabalhar para as estatísticas em vez de nos focarmos em resultados genuínos e concretos.
Por favor, haja o bom senso de nos centrarmos no que é essencial. Haja o bom senso que darmos tempo a que cada reforma ou medida concreta tenha o seu tempo de provar resultados e não façamos “revoluções educativas” de 2 em 2 anos, ao sabor das preferências de cada ministro. Façamos exercícios de cenários para perspectivarmos onde queremos estar daqui a 10 anos, sempre com atenção à cada vez mais acelerada evolução social, cultural e tecnológica.
Olhando para a realidade nacional, como não especialista neste campo, atrevo-me a deixar aqui algumas linhas e sugestões de melhoria:
• Definição rigorosa de metas de aprendizagem – sempre revistas regularmente com vista a aferir a sua adequação às novas exigências;
• Acabar com a estrutura hiper-centralizadora do Ministério da Educação, dando cada vez mais autonomia às escolas para tomarem as suas decisões;
• Envolvimento intenso dos agentes locais (autarquias, associações, empresas) nas estratégias educativas;
• Autonomia e responsabilização em termos de resultados;
• Maior monitorização/ acompanhamento dos estudantes (combatendo o insucesso escolar e medindo sucessos futuros);
• Passar de um paradigma de avaliação de professores para um modelo avaliação da escola e dos resultados;
• Melhor orientação vocacional/ profissional;
• Interligar políticas de família com política de educação – para que a escola não tenha a missão pesada e solitária de garantir tudo o que concerne ao desenvolvimento de qualquer criança ou jovem.
São apenas ideias soltas, que aqui ficam como contributo.

Carlos Sezões

Thursday, March 03, 2011

O Magrebe aqui à porta


Os recentes acontecimentos na Tunísia, no Egipto e na Líbia trouxeram para dentro dos lares europeus, via televisão, toda uma região do mundo aparentemente esquecida, apesar de estar aqui à nossa porta: o denominado Magrebe, região do norte de África que ocupa toda a margem sul do Mediterrâneo, com as suas numerosas sociedades jovens, ávidas de liberdade, democracia, empregos e qualidade de vida.
O momento e a velocidade com que tudo sucedeu são impressionantes. Regimes aparentemente sólidos, governados com mão de ferro, começaram a cair como castelos de cartas. Quem assistiu à queda do Muro de Berlim e dos regimes totalitários da Europa de Leste em 1989-90, não pode deixar de recordar as semelhanças entre estes dois autênticos terramotos históricos.
Para a Europa, a evolução desta região é fundamental. Os recursos energéticos e as matérias-primas aí existentes, as oportunidades de investimento (actuais e futuras) e, principalmente, a gestão da imigração daí originária são variáveis vitais para a geoestratégia europeia.
Na encruzilhada actual, há quem anteveja cenários optimistas e pessimistas. Quem antecipe um quadro mais negro, verá aqui a transição de regimes autoritários (mas simpáticos para o ocidente) para regimes totalitários extremistas, de carácter religioso, no pior exemplo do Irão. Há quem veja, pelo contrário, a oportunidade de emergirem sociedades livres e democracias genuínas e sólidas, com alguma semelhança à Turquia ou às monarquias moderadas da Jordânia e de Marrocos.
Existem esperanças fundadas para este último cenário. Para começar, as revoltas populares foram despoletadas por grupos pouco estruturados, essencialmente constituídos por jovens e os partidos ditos religiosos desempenharam papéis secundários no evoluir das situações. Tem sido referido na comunicação social a importância de blogs e redes sociais (Facebook e Twitter) na disseminação das mensagens e em congregar todos os intervenientes numa causa comum. Tal só foi possível pela existência de segmentos da sociedade minimamente educados e qualificados.
Contudo, a construção de uma democracia exige mais que multidões eufóricas na rua a celebrar a sua liberdade. Pressupõe que as novas constituições e leis fundamentais e os novos sistemas políticos a emergirem garantam o respeito pelos direitos humanos, liberdades e garantias mais elementares (e aqui incluo, a igualdade entre sexos e o direito universal à educação). Pressupõe ainda a clara separação entre religião do Estado, sempre tão melindrosa em países muçulmanos. Exige, por último, instituições que garantam separação dos poderes legislativo, executivo e judicial e que garantam economias de mercado minimamente transparentes, sem pressão das oligarquias antes dominantes.
Estou convencido que o processo será longo e alguns casos tortuoso. E que a fronteira entre o renascimento e o caos poderá ser ténue. Se há uma zona do globo que a (incipiente) política externa europeia deverá funcionar de uma forma sólida e a uma só voz, será aqui.

Carlos Sezões