Friday, November 05, 2010

Cidades sustentáveis: apostar na qualidade de vida


Opinião muito pessoal: boa parte dos nossos problemas, enquanto membros desta grande comunidade chamada Portugal, reside na nossa incapacidade para uma auto-responsabilização e consequente boa gestão dos nossos espaços: conforme a escala considerada, falo das nossas cidades, vilas, aldeias, freguesias ou bairros. Tudo esperamos ser resolvido pelo sempre omnipresente (e quase sempre ineficaz) Estado central. O poder autárquico democraticamente eleito já tem cerca de 35 anos mas, não obstante as suas muitas conquistas, não conseguiu ainda garantir níveis aceitáveis de sustentabilidade, qualidade de vida, conforto e boa gestão do espaço público. Falarei em particular das cidades, como pólos de atracção de pessoas e como focos de inovação cultural, tecnológica e económica. De facto, em sociedades pós-industriais e de forte cariz urbano, novas problemáticas colocam-se a todos os seus cidadãos e políticos-decisores: da desagradação/ desertificação dos centros, à obsolescência das antigas zonas industriais, da mobilidade à eficiência energética, da inevitável multiculturalidade aos fenómenos de pobreza, exclusão e criminalidade, do (des)ordenamento urbanístico à competitividade económico-empresarial, muitos são os desafios que encontramos.
Primeiro, penso ser importante reflectir sobre a questão da sustentabilidade, numa perspectiva integrada. Será que as nossas cidades são realmente sustentáveis nas suas vertentes económica (atracção de investimento e criação de riqueza e empregos), social (inclusão e vida harmoniosa das comunidades) ou ambiental (ordenamento, ocupação do espaço, energia, gestão de resíduos e poluição)? Será que os nossos investimentos em soluções de mobilidade são os adequados? Será viável que a logística de abastecimento alimentar aos centros urbanos continue assente numa rigorosa separação cidade-campo (ainda me recordo das estratégias de agricultura urbana defendidas pelo arquitecto Gonçalo Ribeiro Teles)?
Depois, pensemos a estrutura das cidades, das suas edificações. Uma questão premente é o desenvolvimento de estratégias de recuperação rápida dos centros históricos, que estão no estado que todos conhecemos. Há que fazê-lo com medidas integradas, que promovam a atracção de indivíduos e famílias, nomeadamente nos segmentos etários mais jovens. Aqui, olhando para a realidade portuguesa, não podemos ignorar a necessidade de um novo regime do arrendamento urbano, uma vez que o de 2006 pouco ou nada tem resolvido. A existência de cerca de 400.000 fogos arrendados com contratos celebrados antes de 1990, muitos dos quais com rendas inferiores a 50 euros, é problema que exige medidas efectivas e rápidas (de preferência, que produzam efeitos antes que os edifícios em causa comecem a ruir). Há que criar condições de flexibilidade para a convergência gradual com os preços de mercado e dinamizar a inserção de imóveis devolutos no mercado imobiliário. Como é sabido, somos um país que tem mais de 500.00 imóveis abandonados com consequências inerentes em termos de estética, degradação urbana e insalubridade.
Ainda refiro a necessidade, no âmbito sócio-cultural, de estratégias de “urbanismo de proximidade”. A “cultura de praça” ou “do bairro”, com as suas especificidades, deve ser motivadora para o empenhamento dos seus cidadãos. Promover a cidadania, dignificar o espaço de convívio público, dinamizar a oferta cultural e recreativa, apostar em parcerias e partilha de tarefas com instituições de solidariedade social será fundamental, até para garantir as questões de inclusão antes mencionadas. De facto, os paradigmas do “bairro social” e do “condomínio privado” (ambos exemplos extremos, promotores da exclusão), tão ao gosto português, devem, definitivamente, dar origem a uma cultura de cidade competitiva, atractiva e…sustentável.

Carlos Sezões

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