Wednesday, December 09, 2009

Europa: que projecto, que protagonistas, que ambição?


Confesso que sempre fui um entusiasta do chamado “ideal europeu”. Clarificando o conceito, ter na Europa um espaço e um projecto comum, abraçado por cerca de 500 milhões de pessoas, fundados nos princípios (hoje mais universais) da liberdade, democracia, tolerância, estabilidade social e sustentabilidade ambiental, que daqui se espalharam pelo mundo. Agora, para se construir algo é necessário vontade, capacidade de liderança e instituições que funcionem.
Por tudo isso, sempre vi com bons olhos o Tratado de Lisboa. Parafraseando a velha expressão de Churchill, este tratado será a pior opção do mundo com excepção de todas as restantes que poderiam ser tentadas. Por muitos defeitos que tenha, teoricamente, confere à Europa melhores mecanismos de tomada de decisão, reforça a democracia interna com a atribuição responsabilidades mais importantes ao Parlamento Europeu, incrementa a coerência da sua política externa e facilita, assim, a sua projecção no mundo. Áreas como o combate ao terrorismo ou a segurança energética deverão ser, com o novo tratado, mais bem geridas e coordenadas.
Mas, como sempre as políticas precisam de protagonistas. E aqui, a expectativa era grande, até como contraponto ao que tem sido a imagem de marca da União Europeia: a burocracia instalada de Bruxelas, frequentemente “invisível” aos olhos da opinião pública e dificilmente escrutinada e avaliada. A burocracia que nos brinda com todo o tipo de regulamentos, desde o formato da fruta à restrição do uso de palavras como “Senhor” ou “Senhora” para combater o chamado “sexismo”(!).
De facto, sempre que a Europa avançou foi graças a líderes como Monnet, Schuman ou Delors. É por isso que me pareceu absurda a recusa de alguns países em ter Tony Blair como novo Presidente da União Europeia. Com todo o respeito e benefício da dúvida para Van Rompuy (o excolhido Presidente da União) e Catherine Ashton (responsável pela política externa), parece que, para muitos dirigentes europeus, a opção foi ter protagonistas apagados, pouco relevantes e carismáticos, um mínimo denominador comum com vista a manter os líderes (e interesses) nacionais de cada um acima dos interesses europeus.
Mau sinal, nestes primeiros dias de vigência do tratado. E isto quando os maiores desafios estão aí perante a passividade da Europa. Em primeiro lugar, na política externa, onde a influência da Europa no mundo não cessa de diminuir. Mesmo aqui ao lado, no nosso “quintal”, não conseguimos ser relevantes na resolução dos problemas do Médio-Oriente ou nos enormes desafios colocados ao desenvolvimento de África (comparar, por exemplo, com a influência da China). Depois, em termos de política de defesa e segurança, continua a completa apatia. Apesar de compreender quão impopular será este discurso, os políticos europeus verdadeiramente responsáveis não podem continuar a assobiar para o lado sem falar verdade às suas opiniões públicas e eleitorados: é necessário investir na defesa e participar activamente nas intervenções que, por esse mundo fora, vão sendo feitas, em nome do combate ao terrorismo (ex. Afeganistão) ou da manutenção de paz e estabilidade em várias regiões do globo. A situação de conforto dos últimos 50 anos, de aconchego no abraço protector dos EUA, já não é sustentável neste mundo multipolar. Quem quer ter voz activa e ser respeitado no xadrez das relações internacionais, tem de mostrar vontade e investir. Sim, investir será “pagar” parte das soluções, algumas necessariamente militares.
Por último, talvez o maior desafio, a reforma progressiva do modelo social europeu. Aqui, há que definir e conjugar de forma hábil as políticas relativas à demografia, imigração, segurança social e competitividade das economia, sob pena de a próxima geração de europeus se defrontar com cenários (ainda) mais negros.
Por tudo isto, os europeus devem responder a estas importantes questões: que projecto, que protagonistas, que ambição ainda temos para este velho continente?

Carlos Sezões

0 Comments:

Post a Comment

<< Home