Tuesday, September 01, 2009

Dois “Portugais”? (Jornal "Registo" - 31/08)


Desde já a minha devida e indispensável “declaração de interesses”: para quem não saiba, sou militante do PSD e irei votar no projecto político do meu partido no próximo dia 27 de Setembro. Dito isto, não posso deixar de, com desprendimento emocional, me interrogar sobre os discursos e as “narrativas” políticas que temos ouvido nos últimos meses em Portugal.
Para o Governo PS, Portugal é hoje um país na crista da onda em termos de opções de futuro. É o país das tecnologias nas escolas, das energias renováveis, da administração pública online e do e-government, do Simplex, das Novas Oportunidades, das políticas sociais arrojadas, do TGV, dos carros eléctricos, enfim, um país num frenesim reformista que lhe garantirá o sucesso nas próximas gerações. Tudo isto é, naturalmente, louvável.
Do outro lado, temos, para a oposição, um retrato extremamente duro (e real) de um país com défices de educação e literacia tremendos, com uma justiça indescritível em termos de ineficiência e morosidade, um sistema de saúde que tarda em reorganizar-se para os níveis de serviço pretendidos, com uma economia pouco competitiva e com um endividamento externo brutal, que poderá comprometer o futuro das próximas gerações.
Em que ficamos? O problema é simples: é que, por muito que custe e o Governo actual não admita, o “primeiro Portugal” que mencionei dificilmente tem dimensão e força para puxar pelo segundo. É uma gota de água! O primeiro é um Portugal levemente conjuntural, o segundo, infelizmente, é um Portugal fortemente estrutural.
Efectivamente, de pouco servirá à eficiência global da Administração Pública a abertura de “vias verdes” que, facilitando sem dúvida a vida aos cidadãos, mantêm intocável uma gigantesca máquina burocrática de entidades (institutos, direcções gerais e regionais, agências…) de utilidade duvidosa. Aqui, a verdadeira reforma, que tem de começar pela definição das funções do Estado e respectivos processos de suporte, continua por fazer, apesar das promessas do PRACE. Da mesma forma, de pouco valerão mais computadores no ensino que não for assegurada um novo modelo de gestão das escolas e da sua interacção com a comunidade envolvente. De pouco servirá apregoar a eficiência energética de alguns edifícios se o nosso património urbano se continuar a degradar com as leis de arrendamento arcaicas que temos. Ou pouco conforto nos darão alguns investimentos em sectores de ponta da economia (que são bem-vindos) quando o grosso do nosso tecido produtivo (PME´s) encontram contextos extremamente desfavoráveis para a sua competitividade e sobrevivência (ex. fiscalidade, legislação laboral, apenas para citar os mais evidentes).
Como tal, estas narrativas levam-nos a percepcionar dois “Portugais” mas sem um discurso claro e transparente que nos permita vislumbrar soluções. O caminho possível: começar por reformas nas questões estruturais mas também construir uma visão estratégica de futuro que inclua algumas das boas ideias deste Portugal emergente. Será que o “sectarismo” e o “fundamentalismo” que estão em voga na política portuguesa permitirão este discurso construtivo?

1 Comments:

At 12:25 AM, Blogger mmb said...

Portugais haverá sempre muitos e o Portugal que mais impede o nosso desenvolvimento é precisamente este de que o comentário é expressão: um Portugal pessimista e sempre resmungão, incapaz encarar o sucesso do vizinho ou do adversário político. Há cinco anos que vivo fora de Portugal e pasmo em observar a alegria que vos dá os pontos fracos do governo que são também, para quem está no estrangeiro os fracos de Portugal, (pois o governo português também é Portugal). Jesus Christ, olhem para o país de deixem-se de política partidária. Nunca anteriormente houve um governo que tivesse feito tanto pela Ciencia, Tecnologia e Inovação em Portugal. Não fosse isso, e V.Exa apenas teria "Um Portugal" para falar: o do atraso, do imobilismo e dos "velhos do Restelo".
Freitas

 

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