Monday, January 11, 2010

Ética nas Empresas: precisa-se e recomenda-se! (Jornal Registo - 11/01)


Em tempos conturbados de crise, como os que vivemos e experimentamos, a Ética voltou a estar no centro das atenções. A relação causa-efeito é óbvia: boa parte dos problemas dos mercados financeiros e bancários tiveram na sua origem comportamentos menos éticos e pouco recomendáveis. Desde a ocultação de informação financeira relevante, passando pela gestão dos órgãos dirigentes estar apenas focada nos ganhos de curto prazo, até à irresponsável gestão do risco em proveito próprio, muitas foram as práticas reiteradas que nos colocaram na situação actual.
Mas, apesar da bem-vinda notoriedade do tema, penso que não existe ainda uma noção clara do alcance que a Ética pode e deve ter.
Em primeiro lugar, a clarificação conceptual: a Ética não é um conjunto de regras que alguém se lembrou de escrever. Ética remete para o modo de ser, o carácter, a conduta apropriada que todos assumimos, com convicção. Em suma, estamos a analisar os actos do ser humano, enquanto ser possuidor de consciência e de razão e a definir princípios e valores que, posteriormente, deverão constituir quadros de referência das nossas condutas – como tal, a ética e sua prática deve assentar no sentimento genuíno de obrigação e dever para com o que está correcto (o imperativo categórico, como lhe chamava Kant).
Falando do contexto económico, é aqui que as empresas terão de se preocupar: garantir que no seio das suas decisões operações existam indivíduos com princípios éticos e com condutas morais apropriadas. E claro, que o ambiente (cultura da empresa) que acolhe as pessoas no dia-a-dia seja um facilitador dessas condutas, pautado pelos valores da dignidade do ser humano, da verdade, da justiça e da equidade.
E onde aplicar, onde sairemos do discurso filosófico-teórico e entramos na realidade mais prática? Muito simplesmente, em todas as relações e operações, onde o poder e acção de quem gere tem impacto na vida de outros, sejam estes “públicos internos” ou públicos externos” às instituições. E hoje, como é sabido, em muitas áreas se colocam desafios enormes e autênticos dilemas.
Na relação com os colaboradores, temos o imperativo ético de garantir um equilíbrio mínimo entre vida pessoal e profissional (ex. no volume e flexibilidade de horários, na não discriminação por situação de maternidade ou paternidade), condições de trabalho adequadas ao cumprimento das tarefas, segurança e privacidade (p. ex. a questão tão polémica da intimidade dos emails) e justiça na avaliação e na promoção do mérito, enquanto critério de progressão interna.
Na relação com os clientes, teremos a veracidade na informação veiculada, o compromisso de rigor nos serviços prestados (níveis de qualidade, prazos), a humildade de reconhecer erros na actuação da empresa e de os corrigir com a máxima celeridade, independentemente do seu custo.
Na relação com os accionistas (tema importantíssimo nos mercados financeiros), a divulgação de informações pertinentes de forma objectiva e atempada, sem omissões deliberadas (ver maus exemplos nos casos BPN e BPP).
No que concerne ao público em geral e à comunidade envolvente, há que tomar decisões éticas na redução dos impactos eventualmente negativos que as operações da empresa possam ter – exemplo clássico, os desequilíbrios ecológicos provocados no meio-ambiente por determinadas unidades industriais.
Obviamente que teremos, em muitos destes casos, o choque de interesses entre ganhar dinheiro e ser ético. Mas, mesmo colocando a questão neste ponto, pode-se lançar a interrogação: ser ético, no longo prazo, não será mais rentável que não o ser? Importa pois pugnar, através da consciencialização de empresário e gestores, para que os valores éticos estejam presentes em todos os patamares de actuação das empresas. E possam assim contribuir para a solidez, sustentabilidade e transparência das instituições e para o valor-chave do mundo económico-empresarial: a confiança!

Carlos Sezões

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